sexta-feira, 5 de março de 2010

Dia da Mulher - Inspiração e Saudades

Por: Benigna Soares

Fotos: Ray Nonato (cedidas para a Funpapa)

Criado há 13 anos em Belém, a Casa Abrigo Emanuelle Rendeiro Diniz trabalha com a prevenção de violências praticadas contra as mulheres e acolhe vítimas desse tipo de violação de direitos. Mantido pela Fundação Papa João XXIII (Funpapa), recebeu de 2007 a 2009 um total de 403 pessoas. Cada uma das mulheres que passam pelo abrigo aprendem, com a equipe de psicólogos, assistentes sociais, pedagogo, advogado e outros profissionais, um pouco sobre os seus direitos. Aprendem, por exemplo, que seus agressores, quando denunciados, podem cumprir pena em regime fechado que varia de três meses a três anos, de acordo com o Artigo 44 da Lei 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha. Dependendo dos agravantes do crime essa pena pode ser ainda maior, conforme o Código Penal.

Ao chegar no abrigo as mulheres, muito fragilizadas, levam no corpo e na alma as marcas da violência e um grande desejo de recomeçar. A assistente social Odete Sabá, coordenadora do abrigo, explica que em 2009, dos 116 acolhimentos que realizou 56 eram mulheres vitimadas e 60 eram crianças e adolescentes, filhos das vítimas, que as acompanham na busca por um lugar seguro para fugir dos seus agressores.

Ela lembra que na próxima segunda-feira, 8 de Março, fazem 100 anos de luta pelos direitos da mulher no mundo, 70 anos de luta no Brasil. Mais do que recuperar a auto estima e os direitos da mulher a equipe da Funpapa tem como principal desafio, nesse contexto de séculos lutando contra a violência, a conscientização não só da sociedade para o problema, mas principalmente das mulheres que muitas vezes desconhecem seus direitos. Afinal, entre as mais de 400 mulheres atendidas no “Emanuelle Rendeiro Diniz”, pelo menos 20 delas eram reincidentes. “Apesar da violência física e psicológica que sofrem e de todo o apoio psicológico, jurídico e outros que recebem aqui no Abrigo elas acabam decidindo voltar para o agressor. Nesse caso, voltam a ser agredidas e retornam para o Abrigo”. Afirma Odete Sabá.

Segundo a psicóloga Inês Vitorino os principais sintomas da violência doméstica que as mulheres apresentam quando chegam na Casa Abrigo é a baixa auto estima. “Elas se sentem as piores mulheres do mundo e nosso trabalho é desfazer essa imagem que elas construíram de si mesmas a partir do que ouviram dos companheiros durante muitos anos. Muitas voltam pra eles não só pela dependência financeira, mas emocional e depositam neles força e virtudes que na verdade são delas”. Afirma a psicóloga, para quem a melhor ferramenta de resgate dessas mulheres e mostrar a beleza de suas próprias histórias.

Há quase um mês no abrigo Emanuelle Rendeiro Diniz, uma dona de casa que vamos identificar apenas como Maria, para proteger sua integridade, é exemplo de pessoa bem sucedida. Com trabalho e muito empenho construiu com o marido uma bela e confortável casa, uma vila de imóveis para alugar, carro e outros bens. A parceria veio com o casamento, em 2005, logo após conhecer o futuro marido em uma igreja evangélica. “Eu não imaginava que um homem da igreja, gentil e cheio de promessas, um ano depois me trataria com tanta violência”. Lamenta Maria, mãe de um adolescente de 12 anos a quem ela não pode ver por que está ameaçada de morte. “Ele já tentou me matar muitas vezes, em uma delas, em 2006, vim para este abrigo. Saí pra morar na casa de uma amiga e lá ele me convenceu a voltar pra casa”. Conta Maria, que só sobreviveu do último ataque do marido porque se refugiou, mesmo com chuva, no quintal da casa e foi encontrada por vizinhos em plena madrugada. “Acreditei nas promessas e hoje estou de volta, depois que ele me bateu e queria me obrigar a cometer suicídio na frente dele com uma tesoura”. Relata Maria, 40 anos de idade, abrigada no espaço da Funpapa, enquanto aguarda providências judiciais para que seu agressor deixe a casa e ela possa voltar para o filho em segurança.

Emanuelle Rendeiro Diniz - O nome da Casa Abrigo de Mulheres Vítimas de Violência Doméstica, da Funpapa, é inspirado na história de Emanuelle Rendeiro Diniz, uma adolescente que sonhava em ser jornalista mas foi barbaramente violentada e assassinada aos 14 anos de idade. “Ela escreveu uma poesia onde dizia que nunca queria ser esquecida, que sonhava em ser lembrada por todos. Também gostava muito dos idosos”. Lembra a prima de Emanuelle, Tereza Cristina Rendeiro do Amaral, 32 anos, mesma idade que teria Emanuelle se estivesse viva. Tereza, que atualmente trabalha na Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos (Semaj), da Prefeitura de Belém, relembra com saudades quando estudava com Emanuelle no Colégio Lauro Sodré e se diz feliz por Belém não ter esquecido a história e os sonhos de Emanuelle, que hoje tem um espaço de proteção às mulheres com o seu nome.

Programação – A Fundação Papa João XXIII (Funpapa), além da Casa Abrigo Emanuelle Rendeiro Diniz, mantém outros espaços, programas e serviços voltados para a proteção social das mulheres, como o Abrigo Feminino Dulce Acciole, Espaço de Convivência da Melhor Idade Zoé Gueiros, programa Conquistando a Cidadania (dança contemporânea e ballet), Programa Tribos Urbanas (espaço socioeducativo e de preparação ao mercado de trabalho). Através do Programa de Inclusão Produtiva (PIP), só entre 2005 e 2009, certificou mais de 4 mil pessoas, das quais mais de 90% são mulheres, em cursos de cabeleireiro, manicure e pedicure, recepcionista, maquiagem, operador de caixa, etc.